Chimoio (Moçambique) 23 Ago (AIM) – A greve dos médicos e outros profissionais de saúde está a causar um autêntico sofrimento aos pacientes internados no Hospital Provincial de Chimoio (HPC), província de Manica, centro de Moçambique.
Centenas de pacientes de consultas externas viram os seus encontros com o médico abortados e sem nova data marcada, devido à ausência dos profissionais de saúde, a quase todos os níveis.
Nas enfermarias, tanto os chefes quanto outros profissionais estão a aderir à greve, que terá a duração de mais 21 dias prorrogáveis, tal como anunciou a Associação dos Profissionais de Saúde Unidos e Solidários de Moçambique (APSUSM).
Em Moçambique, os médicos reivindicam alguns direitos no âmbito da implementação da Tabela Salarial Única (TSU).
Estão envolvidos na greve, à escala nacional, perto de 65.000 técnicos, enfermeiros, agentes de serviço, entre outros funcionários do ramo de saúde.
A falta de clareza e coerência na TSU e a melhoria das condições de trabalho são apontadas como principais razões da greve.
A situação está a deixar centenas de pacientes no desespero, quer internados nas enfermarias ou mesmo os que procuram cuidados de saúde nas consultas externas, no Hospital Provincial de Chimoio.
No banco de socorros do Hospital Provincial de Chimoio, por exemplo, na segunda e terça-feira, esteve apenas um médico de traumatologia, auxiliados por estagiários que frequentam os diferentes institutos de formação em saúde.
Não havia enfermeiros nem agentes de serviço. Os serviços básicos estão a ser assegurados por alguns médicos estrangeiros. Também estão envolvidos nesta tarefa médicos militares de diversas especialidades.
“Eu estava na traumatologia. Apenas com um médico. Os que estão sofrendo mais são pacientes internados que necessitam de maior atenção. Na hora da medicação não tem enfermeiro para atendê-los. Alguns acompanhantes optaram mesmo por levar seus pacientes para casa. A situação está mesmo difícil”, explicou uma das estagiárias no Banco de Socorro do Hospital Provincial de Chimoio.
“Nem tudo corre bem neste hospital, por sinal, o maior da província de Manica. Recebe pacientes provenientes de todos os distritos da província. Lamentável, não há condições para que esses pacientes sejam atendidos aqui. Fiz o turno das na manhã e larguei às 14:00 horas. Não foi fácil estando apenas nós estagiários com apenas um médico”, acrescentou.
Explicou que alguns enfermeiros chegaram ao hospital, mas, no primeiro dia da greve, ficaram sentados à espera de hora de sair para casa.
Os estudantes (estagiários), sem a assistência de um enfermeiro capacitado, estão a recorrer a formulários de medicamentos para prescrever fármacos ao doente.
“Essa é a única alternativa que encontramos. Normalmente, só no Banco de Socorro, ficam oito ou dez profissionais, incluindo o chefe do serviço e médicos. Sem contar com os estagiários. Mas, nesses dois dias, éramos apenas cinco estagiários e um médico. Sem enfermeiros nem agentes de serviço”, afirmou.
Contou que “recebemos um paciente em estado grave e quando levamos a cama perdeu a vida.”
“Ficou mais de duas horas sem ser coberto porque não tínhamos lençol, nem servente para cuidar do cadáver. Eu mesma e um colega tivemos de procurar um lençol e fazer a múmia. O hospital está sujo. Precisamos encontrar uma solução o mais breve possível e fazer com que todos os profissionais regressem aos seus locais de trabalho”, disse.
O mesmo problema verifica-se em algumas enfermarias por onde a AIM teve acesso.
Na enfermaria de cirurgia, os pacientes não fazem penso há dois dias. A administração de medicamentos aos doentes está sendo feita por estudantes, na sua maioria de enfermagem geral.
Há casos em que o paciente está em estado grave, necessitando de assistência na sala de cuidados intensivos. A ausência de enfermeiros faz com que estes pacientes fiquem expostos ao perigo de vida.
Os quartos das enfermarias apresentam-se sujos. Pacientes com fraturas profundas e com problema de locomoção permanecem nas camas à espera de um dos familiares para ajudar na higiene ou mesmo outras necessidades.
Na maternidade, os partos estão a ser feitos por estudantes e outro pessoal de apoio. As parteiras não se fazem ao trabalho. Os casos de parto por cesariana estão a ser assegurados por médicos estrangeiros.
O médico chefe Provincial de Manica, Flávio Roque, abandonou o seu gabinete de trabalho para juntar-se às equipas que estão a garantir serviços mínimos naquela que é a maior unidade sanitária da província de Manica.
“Está tudo complicado. As consultas externas são feitas normalmente graças aos médicos estrangeiros. Mas só para aqueles casos que achamos urgente. Como podem ver, sai do meu gabinete para estar aqui como forma de encorajar os poucos profissionais que não aderiram à greve. A nossa missão é salvar vidas. Por isso, estamos aqui a fazer o nosso máximo dia e noite”, explicou Roque, num breve contacto com a AIM.
Segundo ele, como estratégia de resposta à greve, foram mobilizados todos os médicos de diversas especialidades e que faziam trabalhos “burocráticos” para auxiliar as equipas de trabalho compostas, na sua maioria, por médicos estrangeiros e militares.
Contou que o hospital recebeu ajuda de médicos militares e outros provenientes de algumas organizações que trabalham com a saúde.
“São médicos reconhecidos e capacitados para apoiarem neste momento que consideramos crítico. Nosso apelo é que aqueles profissionais olhem para o sofrimento da população, tenham o sentimento e regressem para cumprir o juramento que fizeram em servir a população”, apelou.
O Hospital Provincial de Chimoio tem 51 médicos especialistas moçambicanos, sendo 44 de clínica geral.
Deste número, estão ausentes 34 médicos de clínica geral. Os especialistas estão a trabalhar. Existem, naquela unidade sanitária, um total de 363 enfermeiros gerais e 235 agentes de serviço.
(AIM)
Nestor Magado (NM)/dt