Madrid, Espanha, 16 Nov (AIM)- O Parlamento espanhol votou esta quinta-feira a investidura do líder do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), Pedro Sanchéz, como primeiro-ministro da nova legislatura saída das eleições de 23 de Julho, em que os conservadores do Partido Popular (PP) venceram, mas sem conseguir uma maioria absoluta com o Vox, um partido de extrema-direita.
Pedro Sánchez foi reeleito com 179 votos a favor (os do PSOE, Sumar, EH Bildu, PNV, ERC, Junts, BNG e CC) e por 171 votos contra (os do PP, Vox e UPN.
Sánchez precisava do ‘sim’ de uma maioria absoluta de 179 deputados de oito partidos, numa ‘geringonça’ de formações de esquerda e direita, regionalistas, nacionalistas e independentistas.
O PSOE foi a segunda força mais votada nas legislativas e vai assumir o governo em coligação com o Somar, uma plataforma de formações de esquerda e extrema-esquerda, liderada pela actual ministra do Trabalho, Yolanda Díaz.
O novo Governo foi viabilizado, no parlamento, por mais seis partidos: Coligação Canária (CC), Bloco Nacionalista Galego (BNG), Juntos pela Catalunha (JxCat), Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), EH Bildu (do País Basco) e Partido Nacionalista Basco (PNV, na sigla em espanhol).
Os acordos para a viabilização do Governo que o PSOE assinou com os dois partidos catalães têm estado no centro de polémica e protestos, por incluírem uma amnistia para as pessoas envolvidas no movimento independentista da Catalunha entre 2012 e 2023, que teve como auge uma declaração unilateral de independência em Outubro de 2017.
A amnistia é contestada pela direita e por diversas entidades e sectores, incluindo associações de juízes e procuradores, que alertaram para a possibilidade de um ataque ao princípio da separação de poderes, à independência da Justiça e ao estado de direito.
Por outro lado, a amnistia tem também sido contestada nas ruas, como aconteceu no domingo, em manifestações em 52 cidades convocadas pelo Partido Popular (PP, direita), que mobilizaram dois milhões de pessoas, segundo o partido, e 450 mil, segundo as autoridades de segurança.
Na quarta-feira, dia 15 de Novembro corrente, na abertura do debate da investidura, Sánchez justificou a amnistia por ser a via para recuperar a convivência entre os espanhóis e também a forma de garantir um governo ‘de progresso’ em Espanha face à ameaça da ‘direita reaccionária’.
A amnistia é pedida por 80 por cento dos catalães e defendida por uma maioria absoluta de representantes dos espanhóis no parlamento, realçou Sánchez, que admitiu estar a fazer ‘da necessidade, virtude’, numa referência aos apoios que teve de reunir para continuar a ser primeiro-ministro.
O líder do PSOE acusou o PP de, como noutros países do mundo, se ter deixado parasitar pela extrema-direita e pelo partido Vox e acrescentou que face ‘às direitas reaccionárias e retrógradas’, que querem ‘meter as mulheres na cozinha, as pessoas LGBT nos armários e os migrantes em campos de refugiados’, a opção é um novo governo de esquerda apoiado por partidos ‘com diferenças importantes’, mas que partilham o desejo de fazer o país avançar.
GOVERNAR A SOLO NA EUROPA CADA VEZ MAIS IMPROVÁVEL PARA PARTIDO CHAMADOS DO ARCO DO PODER
Como tantos outros países na Europa (incluindo Portugal), o que Espanha fez é quebrar o “cordão sanitário” que separava os partidos do sistema dos chamados partidos populistas. Assim, Pedro Sánchez vai continuar a ser primeiro-ministro e, para isso, precisou de ceder às pretensões de partidos conotados com a extrema-esquerda, como o Sumar, além de outros com reivindicações nacionalistas, como os catalães do Junts e da ERC ou os bascos do EH Bildu e PNV.
Esta foi a única forma de encontrar uma solução governativa em Espanha, e seria igual caso fosse a direita a formar governo – o PP juntar-se-ia aos partidos à sua direita, nomeadamente ao Vox, seguindo os passos do que já aconteceu em Itália, Suécia ou Finlândia, onde partidos extremistas apoiam os governos. A única diferença neste caso é que a coligação surge à esquerda e não à direita.
Segundo o investigador do ISCTE (Instituto Universitário de Lisboa), Riccardo Marchi, citado pela CNN Portugal, esta é a evolução natural da “descrença do eleitorado em relação aos partidos tradicionais das democracias europeias”, o que vai levar a que seja cada vez mais difícil que os chamados partidos mainstream consigam governar sozinhos.
“Não há uma descrença no modelo democrático. Há uma insatisfação, mas não com a democracia em si, é com o sistema”, diz o especialista em populismos.
Isto porque os eleitores se aproximam dos partidos mais radicais para “lançar uma mensagem em relação aos partidos tradicionais, mas não em relação ao regime”, pelo que não existe uma ameaça à democracia liberal.
O professor catedrático José Filipe Pinto diz que tudo isto surge depois de várias décadas em que os partidos tradicionais controlaram o sistema. À excepção daquilo que aconteceu em Itália, onde um escândalo político e judicial provou a corrupção instalada em vários partidos, levando a uma maior preponderância dos partidos antissistema, no resto da Europa ‘os partidos populistas estão a caminhar das margens para o centro do sistema’.
(AIM)
DM