Londres, 31 Jan (AIM) – O Tribunal Supremo de Londres decidiu, terça-feira (30), liberar à AIM, outros órgãos de comunicação social e instituições que estão a cobrir o julgamento do caso “dívidas ocultas” de Moçambique uma pilha enorme de documentos anteriormente classificados como confidenciais.
O caso “dívidas ocultas” é referente aos empréstimos acima de dois bilhões de dólares americanos contraídos em 2013 e 2014 por três empresas moçambicanas ligadas à segurança (Proindicus, Ematum e MAM) pelos bancos Credit Suisse e VTB da Rússia.
Em teoria, os empréstimos eram para, entre outros, financiar uma empresa de pesca de atum (EMATUM), estaleiros navais e segurança marítima. Mas nenhuma das referidas empresas a funcionar efectivamente, por isso foram à falência.
No entanto, a história não termina aqui, pois os empréstimos dos projectos tinham uma garantia do Estado, o que significa que o governo tornou-se responsável por pagar essas dívidas.
Essencialmente, o julgamento de Londres está analisar se essas garantias são nulas devido aos subornos pagos a funcionários do governo moçambicano e outras irregularidades graves no processo, bem como se a empresa no centro do escândalo, a Privinvest, deve pagar uma indeminização superior a três bilhões de dólares.
No dia 23 de Janeiro, o juiz da causa Robin Knowles, decidiu que dezenas de documentos fossem disponibilizados e solicitou que os advogados de Moçambique, Peters & Peters, facilitassem o processo. Em particular, o juiz Knowles registou o pedido da AIM para a divulgação de relatórios de peritos que tinham sido retidos pela Privinvest.
Entre os documentos divulgados consta o acordo extrajudicial confidencial alcançado entre Moçambique, o Credit Suisse e oito outras instituições financeiras referente ao acordo de financiamento da Proindicus – no qual o Credit Suisse era o banco líder.
O acordo de compensação, datado de 30 de Setembro de 2023, tem um objectivo claro que é extinguir qualquer responsabilidade que Moçambique teria de outra forma em dívidas ou danos, em troca de liberar as outras partes do acordo de qualquer responsabilidade decorrente das irregularidades reveladas no julgamento.
No entanto, menciona especificamente que “para evitar dúvidas” nada no acordo comprometerá os direitos de Moçambique contra a Privinvest, ou o VTB e o banco português BCP. Também não limita os direitos de Moçambique de “investigar, processar ou de outra forma prosseguir qualquer acção criminal, processo criminal ou procedimento criminal”.
A principal vantagem para Moçambique é que, como troca da renúncia no processo contra o Credit Suisse, o banco suíço anulou a dívida remanescente.
Durante o julgamento em Londres, o advogado moçambicano Joe Smouha revelou que, em resultado do acordo, o Credit Suisse concordou em renunciar à totalidade da dívida pendente, que ascendia a 450 milhões de dólares americanos. Em troca, Moçambique concordou em não processar o banco para obter uma indemnização.
As outras oito instituições financeiras também concordaram em renunciar todas as reivindicações contra Moçambique e o acordo enumera os montantes que receberiam em pagamento final da República da seguinte forma:
Atlantic Forfaitierungs US$1.000.000
Banco Internacional de Moçambique (BIM) US$38.188.800
Banco Comercial e de Investimentos (BCI) US$15.840.000
Farallon Capital US$15.120.000
ICE Canyon US$5.000.000
Moza Banco US$20.592.000
United Bank for Africa (UBA) US$21.840.000
VR Global Partners US$12.240.000
Os credores internacionais foram pagos em dólares, enquanto os bancos moçambicanos receberam seu pagamento na moeda local, na forma de títulos.
Analistas financeiros disseram à AIM que o acordo foi bom para Moçambique. O Credit Suisse, na qualidade de banco líder, esteve no centro do escândalo, com os principais membros da sua “equipa de negociação” a receberem subornos em troca de fazerem avançar os empréstimos.
Três dos negociadores do Credit Suisse (Andrew Pearse, Detelina Sibeva e Surjan Singh) confessaram em um tribunal de Nova Iorque que tinham recebido subornos da Privinvest. Por conseguinte, havia poucas perspectivas de o Credit Suisse recuperar qualquer parte da dívida de Moçambique.
Mas, à medida que nos distanciamos do centro do escândalo, torna-se menos claro apurar até que ponto os outros credores tinham conhecimento da corrupção e da fraude. Assim, o acordo constitui uma aceitação tácita do carácter de “boa fé” das oito instituições financeiras e é considerado um compromisso justo para pôr termo à questão.
Em Dezembro, os restantes litigantes apresentaram as suas alegações finais ao Tribunal e o Juiz Robin Knowles está actualmente a analisar as provas. Espera-se que profira o seu acórdão nos próximos dois meses. É pouco provável que esta decisão seja afectada pela morte, na segunda-feira, do bilionário libanês Iskandar Safa, fundador e proprietário do grupo Privinvest.
(AIM)
jhu/