Maputo, 02 Abr (AIM) – Seis em cada dez alunas que frequentam o ensino superior em Moçambique já foram vítimas de assédio sexual perpetrado pelos seus docentes, revela um estudo lançado hoje, na Universidade Pedagógica, em Maputo.
Porém, o número de denúncias registadas está longe de espelhar a realidade de casos que verdadeiramente ocorrem no ambiente académico, representando assim, a ponta do “iceberg” de um número maior silenciado pelas vítimas por temerem represálias académicas e por descrédito dos canais de denúncia existentes.
O estudo, intitulado “Assédio Sexual no Ensino Superior em Moçambique: Quando a Vítima é Filha Alheia Ninguém se Preocupa” explica que parte considerável não chega a denunciar por temer represálias, e as poucas que têm a coragem de denunciar não encontram acolhimento de quem é de direito.
Os resultados do estudo foram divulgados pela investigadora do Centro de Integridade Pública (CIP), Milagrosa Calangue, que envolveu oito instituições de ensino superior, em quatro províncias, Maputo, Gaza, Inhambane e Tete no período compreendido entre os anos de 2019 e 2022.
A falta de provas materiais e a má instrução processual são as causas mais comuns usadas, pelas instituições responsáveis por punir práticas de assédio sexual, para evitar a responsabilização dos implicados, facto que acresce o sentimento de impunidade face aos infractores e desencoraja futuras denúncias.
Sobre os resultados de pesquisa de campo, o estudo revelou que, das 30 denúncias de assédio sexual nas instituições de ensino superior, a maioria (15) terminaram arquivadas, alegadamente por falta de provas. Entretanto, seis dos casos estão em andamento e nove, apenas, conheceram um desfecho que culminou com a punição dos implicados, sendo oito punições “brandas” (repreensão, transferência, afastar e suspensão) é uma, apenas mais severa, expulsão.
O assédio sexual no ensino superior é entendido como sextorsão, quando a extorsão por quem detém a autoridade, ao invés de ser cobrada em valores monetários, é cobrada por troca de favores sexuais com os utentes dos serviços públicos. Portanto, a impunidade que caracteriza os crimes de corrupção em Moçambique, também reina nos crimes de assédio.
Um outro estudo, realizado pelo Centro de Género e Direcção de Pós-graduação da Faculdade de Educação e Psicologia em parceria com a Associação h2n, sobre a prevalência de casos de assédio sexual na Universidade Pedagógica de Maputo, aponta que 66 estudantes, num total de 189 participantes, relataram casos de assédio sexual.
Por sua vez, em 2023, o Mídia Lab conduziu um inquérito envolvendo algumas estudantes universitárias e os resultados são ainda mais preocupantes. O inquérito revelou que pelo menos 1.000 mulheres que frequentam o ensino superior em Moçambique sofrem ou sofreram, algum tipo de assédio. Deste universo, só 60 pessoas, o que equivale a 6% é que já denunciaram.
E, das que denunciaram, apenas oito pessoas tiveram os seus casos parcialmente resolvidos. Das 1000 mulheres que revelaram ter sofrido assédio, 50% são da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), 26% da Universidade Joaquim Chissano, 16% da Universidade Pedagógica de Maputo e 8% da Uni-Púnguè.
Com base nos dados obtidos nas instituições de ensino, no Ministério de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) e no Ministério Público (MP), 2023, constatou-se que, é na UEM que se concentra a grande maioria dos casos, registaram-se 10 denúncias equivalentes a 33,3% dos casos. Destes casos, quatro foram arquivados, cinco tiveram Provincial de Inhambane.
A falta de “provas materiais desfechos, que culminou com a punição dos implicados, é um está em andamento na Procuradoria ” por parte das denunciantes foi usada pelas instituições para justificar o arquivamento de 12 processos de assédio sexual, que representam 80% do total de denúncias arquivadas.
Como recomendações o estudo propõe a criação/ promoção de órgãos sociais, que funcionem fora das instituições de ensino, para que recebam e tratem de denúncias de assédio sexual, reforço dos mecanismos que garantam a protecção de denunciantes, para evitar possíveis retaliações e incentivar as denúncias, responsabilização dos implicados, na base das sanções estabelecidas nos regulamentos aplicados e tendo em conta as suas agravantes, sempre que necessário, entre outras.
(AIM)
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