
Polícia queniana dispara gás lacrimogéneo para dispersar manifestantes em Nairobi. Foto Daily Star
Nairobi, 27 Jun (AIM) – A polícia queniana disparou balas de borracha e bombas de gás lacrimogéneo em Nairobi nesta quinta-feira, quando manifestantes voltaram às ruas da capital para um acto em homenagem às vítimas da repressão brutal a protestos contra um plano de aumento de impostos, no começo da semana, que provocou a morte de pelo menos 22 pessoas.
A nova manifestação foi mantida, apesar do recuo do presidente, William Ruto, sobre a aprovação do projecto.
Os protestos, liderados em grande parte por jovens quenianos, colheram de surpresa as autoridades, enquanto o governo de Ruto oscilava entre adoptar uma linha dura em relação aos distúrbios e apelar ao diálogo.
Dezenas de manifestantes reuniram-se na zona comercial central de Nairobi. Soldados destacados e policiais com equipamento anti-motim bloquearam o acesso ao longo das estradas que levam ao gabinete de Ruto na Casa do Estado e ao parlamento.
Agentes da polícia dispararam balas de borracha e gás lacrimogéneo contra pequenos grupos de manifestantes e prenderam pelo menos sete pessoas. Os confrontos eclodiram quando alguns manifestantes atiraram pedras contra a polícia, reporta a AFP.
Muitas lojas permaneceram fechadas na capital enquanto os comerciantes se preocupavam com mais agitação. Os manifestantes também se reuniram na cidade portuária de Mombaça e no bastião da oposição de Kisumu, com alguns bloqueando estradas e ateando fogo a pneus na cidade à beira do lago.
Depois que o complexo do parlamento foi saqueado na terça-feira e a polícia abriu fogo contra os manifestantes, Ruto recusou-se a sancionar os aumentos e retirou o projecto na quarta-feira.
Mas os manifestantes mantiveram a manifestação de quinta-feira em memória dos mortos nas manifestações, criticando a reviravolta dramática de Ruto.
Ivy, uma jovem de 26 anos, disse à AFP na quarta-feira que a reviravolta de Ruto foi “um começo para mudar as coisas”.
“Ele poderia ter feito isso antes, sem que as pessoas morressem”, acrescentou ela, ecoando as palavras de outros manifestantes.
Um grupo de direitos humanos apoiado pelo Estado contou 22 mortos em todo o país – 19 só em Nairobi — na sequência dos protestos de terça-feira e prometeu uma investigação.
Este é o maior número de mortes num único dia de protesto — disse Roseline Odede, presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos do Quénia, financiada pelo Estado, acrescentando que 300 pessoas ficaram feridas em todo o país.
“Não podemos correr riscos. Não sabemos o que acontece a seguir”, disse Joe, funcionário de uma perfumaria, enquanto se preparava para voltar para casa. — Por que eles tiveram que matar esses jovens? Este projecto de lei não vale a pena que as pessoas morram.
A agitação alarmou a comunidade internacional, com os EUA apelando ao Quénia para respeitar o direito ao protesto pacífico, e o apelo da ONU à “responsabilização” pelo derramamento de sangue.
Activistas dos direitos humanos acusaram as autoridades de sequestrar manifestantes, mas a polícia não respondeu aos pedidos de comentários da AFP.
Ruto reverteu algumas das medidas fiscais na semana passada, o que levou o Tesouro a alertar para um deficit orçamental de 200 bilhões de xelins. O presidente disse na quarta-feira que a retirada do projecto de lei significaria um buraco significativo no financiamento de programas de desenvolvimento para ajudar agricultores e professores, entre outros.
O governo, sem dinheiro, tinha dito anteriormente que os aumentos eram necessários para pagar a dívida do Quénia de cerca de 10 bilhões de xelins, equivalente a cerca de 70 por cento do PIB.
Analistas alertaram que a administração de Ruto enfrentará uma escolha difícil nas próximas semanas.
O governo “terá agora de encontrar uma forma de pacificar duas forças opostas: uma população disposta a recorrer à violência para proteger os meios de subsistência e uma trajectória macroeconómica que, salvo um apoio multilateral considerável, está a caminhar para um precipício”, afirmou a Oxford Economics em um comunicado.
A administração de Ruto está sob pressão do Fundo Monetário Internacional, que apelou a reformas fiscais para conceder financiamento.
(AIM)
AFP/sg