
Maputo, 23 Abr (AIM) – As autoridades judiciais manifestam a sua preocupação com a posição no ranking de Moçambique, 10ª, dos países com o maior índice de casamentos prematuros, mesmo volvidos cinco anos após a criação da Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras (Lei N.° 19/2019).
A informação foi partilhada esta quarta-feira (23), em Maputo, pelo ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, (MJCR), Mateus Saize, durante a Conferência Internacional do 5° Aniversário da Lei N.° 19/2019: Prevenção e Combate às Uniões Prematuras, evento de dois dias.
Saize referiu que, com a aprovação do Diploma Legal, Moçambique tornou-se um “País modelo no combate às uniões prematuras no continente e na região”, mas prevalecem os desafios.
“Apesar da Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematura, que estabelece penas de 2 a 12 anos de prisão e multas até 2 anos, dependendo da gravidade do crime, continua a ser a nossa maior preocupação a componente da prevenção e eliminação total da prática de uniões prematuras em algumas regiões do país”,
Para Saize, os factores sócio-económicos e culturais, com destaque para o baixo nível de escolaridade, a pobreza absoluta, ritos de iniciação, gravidez na adolescência, os choques climáticos, fraca divulgação da legislação e das políticas públicas que protegem as crianças, são as principais causas do crescente número de uniões prematuras em Moçambique.
Facto corroborado pela representante da UNICEF, Mary Eagleton que, se apoiando ao lema desta conferência, “Não interrompa a Infância: Stop Uniões Prematuras”, sustentou que as uniões prematuras constituem uma violação grave dos direitos humanos, privando as meninas da sua infância, educação e futuro, além disso, compromete o desenvolvimento nacional.
Refira-se que, em Moçambique, uma em cada duas meninas foi unida maritalmente antes dos 18 anos, e uma em cada oito antes dos 15 anos. (IDS, 2022)
“Os dados demonstram uma forte correlação entre o aumento das taxas de uniões prematuras e o baixo nível educacional das raparigas e o início da vida sexual”, disse.
Entretanto, o director nacional de Assistência Jurídica e Patrocínio Judiciário, Elone Chichava, apontou, dentre vários, os desafios enfrentados na implementação da Lei das uniões prematuras ao longo dos cinco anos, apesar dos avanços alcançados, em particular, a promulgação e implementação de políticas e programas complementares sobre a lei de uniões prematuras, como a criação de um mecanismo multissectorial de coordenação para a protecção da criança, integrando sectores de género, justiça, educação e saúde.
“As barreiras culturais e normas sociais enraizadas em práticas culturais tradicionais de certas comunidades, muitas vezes aliadas à pobreza estrutural de muitas famílias moçambicanas são um dos epicentros das uniões prematuras”, apontou.
Frisou ainda que o desconhecimento do conteúdo da Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras constitui um desafio crítico para muitas pessoas, inclusive para os actores do sistema de justiça.
Por isso, Chichava entende ser papel do Governo e parceiros, intensificar os esforços de implantação da lei das uniões prematuras face aos desafios apontados, bem como reforçar a divulgação e apropriação da lei pelas comunidades, através da intensificação de campanhas de educação cívica comunitárias.
Deve, igualmente, engajar e capacitar os líderes locais e órgãos de base, com vista a massificar a aplicação da lei nas zonas rurais, bem como expandir o programa de justiça itinerante, através dos tribunais móveis, e assistência jurídica.
É indispensável o fortalecimento da formação e a presença de agentes da lei em todos os níveis, intensificar a formação especializada de todos actores do sistema de justiça e protecção da criança, tal como a sensibilização contínua dos tomadores de decisão e alocação de recursos adequados e garantir que a luta contra as uniões prematuras permaneça como prioridade política de alto nível.
Recorde-se que, pelo menos 2.259 raparigas foram reintegradas ao convívio familiar desde 2020 depois de estarem envolvidas em uniões prematuras, fruto de trabalhos levados a cabo pelo governo e parceiros no quadro dos programas de acção social.
O evento contou com a presença dos representantes da região Norte, Centro e Sul, das delegações estrangeiras provenientes da Etiópia, Malawi e Zâmbia, instituições do Estado, parceiros de cooperação e Organizações da Sociedade Civil.
(AIM)
NL/sg