
Maputo, 30 Jun (AIM) – O relatório sobre a dívida pública referente ao exercício fiscal 2023 revela um aumento exponencial do volume do serviço da dívida, com o somatório das amortizações e pagamentos de juros a atingir o pico histórico de 2,1 mil milhões de dólares.
“A cifra representa um agravamento de 70 por cento comparativamente a despesa do ano anterior (2022)”, lê-se no relatório do Ministério de Economia e Finanças sobre a dívida pública.
O documento explica que o incremento foi determinado por variações de obrigações em duas rubricas da dívida interna, nomeadamente as amortizações dos empréstimos junto do Banco Central que cresceram de 3,5 mil milhões em 2022 para 26,7 mil milhões de meticais em 2023 e os reembolsos que saíram de 23,9 mil milhões de meticais para 44 mil milhões em 2023.
Isso significa que, no horizonte do médio prazo, a despesa do Estado com o serviço da dívida permanecerá a níveis de pico nos próximos três anos, e a despesa pública continuará acima de dois mil milhões de dólares, dos quais cerca de 60 por cento absorvidos pelo serviço da dívida interna e 40 por cento com a dívida externa.
O documento refere que, actualmente, a dívida do sector do Estado continua em crescimento, tendo incrementado na ordem de 4,5 por cento de 2022 para 2023, atingindo um volume total de 15,8 mil milhões de dólares norte-americanos, correspondente a 76 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) moçambicano.
Outro documento do MEF, intitulado Boletim Trimestral sobre Dívida Pública, que retrata a evolução da dívida do Governo central no primeiro trimestre de 2024 (Janeiro a Março), destaca o comportamento do stock do serviço da dívida e dos desembolsos que continua em ascensão.
Aponta que o serviço da dívida pública externa no período em análise, situou-se em 204,11 milhões de dólares, sendo 125,27 milhões de dólares correspondentes a amortização do capital e 78,84 milhões de dólares ao pagamento de juros, o que representa um incremento na ordem de 65,11 milhões de dólares (47%), em relação ao quarto trimestre de 2023.
Para o serviço da dívida pública interna no mesmo período, o valor total situou-se em 54.446,60 milhões de meticais (855,49 milhões de dólares), sendo 43.492,97 milhões de meticais (683,38 milhões de dólares) correspondentes a amortização do capital e 10.953,63 milhões de meticais (172,11 milhões de dólares) ao pagamento de juros.
Perante o cenário, o economista nacional, Egas Daniel, filiado a International Growth Centre da London School of Economics, defende uma amortização da dívida sem acumulação de novo endividamento público interno, por se mostrar mais caro em termos de pagamento de prestações ou amortizações.
O académico, que falava à AIM, aponta três implicações directas em relação ao drama da dívida pública, sendo a primeira relacionada com a pressão que o Estado poderá estar sujeito a recorrer a mais dívidas para pagar dívidas.
A segunda tem a ver com o facto de o Executivo ter que mobilizar anualmente cerca de dois mil milhões de dólares para pagar dívidas, factor que limita a capacidade do Estado investir no sector produtivo, bem como na construção de infra-estruturas económicas como sociais.
A terceira implicação segundo o economista é que, o alto endividamento, pelo menos na perspectiva interna, aumenta o perfil do risco que o Estado apresenta quando vai buscar financiamento dentro e fora do país.
“Nessa situação o Estado fica com menos aceitação para continuar a contratar dívidas, ou se tiver que o fazê-lo estará sujeito ao pagamento de taxas de juro elevadas por estar numa situação de insustentabilidade. Isso limita a capacidade do Estado buscar novos financiamentos e, como consequência, fraca capacidade do Estado continuar a investir a longo prazo”, disse a fonte.
De acordo com a fonte, o Estado poderá enfrentar dificuldades de se autofinanciar devido a pressão das despesas correntes, apontado como saída, a contenção da expansão das despesas e mobilização de receitas alternativas evitando contrair mais endividamento comercial que se apresenta oneroso.
Por isso, Egas Daniel sugere aceleração de reformas que promovam uma maior diversificação e dinamização do mercado da dívida, viabilizando a redução do custo do financiamento doméstico e gestão do passivo já existente.
Os números do Banco de Moçambique, como regulador do sistema financeiro, indicam que o endividamento público interno aumentou exponencialmente de 51.910 milhões de meticais entre Dezembro de 2023 a Maio de 2024, fixando o montante perto de 370 milhões de meticais.
O Banco Central aponta como um dos motivos, o incumprimento das recomendações e alertas do regulador sobre o excessivo endividamento do executivo para financiar a despesa pública.
Recentemente, o Governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, afirmou que o elevado endividamento do Executivo está a impor sérias limitações à capacidade operacional do banco central na implementação de políticas económicas eficazes.
Essa declaração foi feita durante a conferência de alto nível dos timoneiros dos bancos centrais em África, havida no Ruanda.
“O sector público está fortemente endividado. Isso complica a nossa vida. Contudo, não paramos por aí. Quando analisamos qualquer sector corporativo no país, também encontramos vulnerabilidades internas consideráveis”, declarou.
(AIM)
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