
Nampula (Moçambique), 21 Abr (AIM) – O delegado do Conselho Islâmico de Moçambique (CISLAMO) em Cabo Delgado, José Assuate, descarta a motivação religiosa para explicar o fenómeno do terrorismo que grassa naquela zona do norte do país.
Em entrevista à AIM, em Nampula, o líder religioso afirmou que os eventos fatídicos que ocorrem em Cabo Delgado são contrários à religião islâmica que proclama a paz, e que os motivos do que se passa devem continuar a ser procurados noutras dimensões.
Na última semana decorreu, na cidade nortenha de Nampula, a Primeira Conferência Nacional da Juventude Islâmica- 2024, organizada pelo gabinete juvenil do CISLAMO, uma iniciativa que serviu para reflectir sobre o papel deste grupo social na luta contra o terrorismo, promoção da paz e segurança em Moçambique.
“Não concordo de modo algum com tais acepções porque são análises feitas sem colocar em conta o contexto de Cabo Delgado, por isso descarto a exclusão social como sendo a causa do fenómeno terrorismo muito menos que seja uma questão religiosa”, afirmou categoricamente.
Em defesa das suas ideias, José Assuate definiu que a religião islâmica tem como doutrina a promoção da paz e a condenação da violência.
“Não é algo religioso e quando vejo a prática dos terroristas, a questão das matanças, isso não é orientação religiosa, No Islamismo é proibido, não podes tirar a vida do próximo, o nosso Profeta recomendou-nos a paz e boa convivência inter-religiosa. Em Cabo Delgado existe essa conivência”, acrescentou.
A nossa fonte sustentou que há razoes obscuras que levaram o terrorismo à Cabo Delgado.
“O que posso dizer taxativamente é que o trouxe o terrorismo a Cabo Delgado são questões obscuras, vamos trabalhar para encontrarmos qual a causa deste mal e, para tal, devemos estar unidos coesos, juntos, deixemos as acusações contra este ou aquele”, concluiu.
O director nacional dos Assuntos Religiosos no Ministério da Justiça, que representou o governo neste encontro da juventude islâmica, Saide Habibe, fez notar que as dinâmicas actuais convergem para moldar a identidade da juventude face aos diversos desafios que hoje o país enfrenta como nação.
Além disso referiu que “diante do contexto e dos diversos cenários que nos atravessam, é imperativo transpor o campo da racionalidade e quebrar o paradigma da normatização da violência, em particular, a violência em nome da religião”.
Habibe destacou ainda que Moçambique, embora seja um Estado laico, reconhece e valoriza as actividades das confissões religiosas visando promover um clima de entendimento, tolerância, paz e o reforço da unidade nacional, o bem-estar espiritual e material dos cidadãos e o desenvolvimento económico e social.
“O carácter multidimensional dos conflitos faz com que a violência seja um fenómeno discutido e estudado por diferentes campos das ciências humanas. A religião, muitas vezes, aparece no centro destas grandes batalhas. Se, por um lado, ela é mediadora de conflitos, é bem verdade que ela também pode ser potencialmente usada para gerar tais conflitos”.
Concluiu que “precisamos pleitear acções e atitudes que possibilitem espaços de reflexão e partilha acerca do tema e compreender a religião como ferramenta potencial na construção de uma cultura de paz”.
Por seu turno o académico Calton Cadeado, convidado nesta conferência da Juventude Islâmica, referiu ter sido, esta, uma iniciativa muito importante, por ser inquestionável a necessidade de debater este assunto de forma frontal com todo o tipo de sensibilidade.
“É importante tomando em consideração que este é um assunto que mexe com muitas emoções, sobretudo porque envolve fé, em qualquer parte do mundo, uma discussão que envolve esses valores tende a resvalar para esse lado da emoção e esquecer-se a racionalidade,” salientou.
Sobre as narrativas divergentes para explicar as causas do terrorismo que assola Cabo Delgado, o historiador considerou-as interessantes para um debate mais profundo.
Disse ser muito bom também porque são narrativas diferentes, não há uma tentativa de criar unanimismos, pensar-se que se sabe tudo enquanto é importante partilhar os saberes.
“Estamos a tratar de um assunto sensível. Também é bom olhar para este assunto como quem está à procura de soluções, o interesse não é só levantar as causas, mas igualmente procurar soluções, já estamos a seis/sete anos a estudar o assunto, é verdade que nunca vamos abandonar o estudo. Mas, também, para credibilizar os estudos é preciso que haja sempre evidências para fazer o argumento robusto”, finalizou.
A primeira conferência nacional da Juventude Islâmica teve a duração de dois dias e abordou temas como a radicalização de jovens muçulmanos, o papel das confissões religiosas na luta contra o terrorismo, promoção da paz, coexistência religiosa, entre outros.
(AIM)
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