
Antigo ministro moçambicano das Finanças, Manuel Chang
Maputo, 18 Jan (AIM) – Um tribunal da cidade norte-americana de Nova Iorque condenou, sexta-feira (17), o antigo ministro moçambicano das Finanças, Manuel Chang, a uma pena de oito anos e meio de prisão pelo seu papel no escândalo das “dívidas ocultas”.
Esta expressão refere-se ao esquema através do qual três empresas estatais moçambicanas, nomeadamente a Proindicus, Ematum e MAM, todas geridas pelos serviços de segurança, SISE, obtiveram empréstimos no valor superior a mais de dois mil milhões de dólares americanos junto dos bancos Credit Suisse e VTB da Rússia.
Nenhum banco no seu perfeito juízo concederia empréstimos tão avultados a empresas sem due diligence e geridas por um serviço de informações. Mas quaisquer dúvidas que o Credit Suisse e o VTB possam ter tido esfumaram-se quando Chang, na altura Ministro das Finanças, assinou garantias soberanas, o que significava que, se as empresas entrassem em incumprimento, o Estado moçambicano reembolsaria os bancos.
E, de facto, as três empresas foram a falência, e assim os empréstimos ocultos transformaram-se em dívidas ocultas. As garantias assinadas por Chang eram ilícitas, uma vez que os empréstimos ultrapassaram o limite máximo de crédito estabelecido nas leis orçamentais de 2013 e 2014.
Os empréstimos referidos não passavam de um esquema corrupto concebido pelo grupo Privinvest, empesa com sede em Abu Dhabi, que gastou centenas de milhões de dólares a subornar funcionários e dirigentes moçambicanos (incluindo Chang) e banqueiros do Credit Suisse.
Ao abrigo destes acordos, a Privinvest tornou-se o único contratante das três empresas, a quem vendeu barcos de pesca, estações de radar e outros bens a preços muito inflacionados. Uma auditoria independente às empresas revelou que a Privinvest as tinha sobrefacturado em mais de 700 milhões de dólares.
Chang viria a ser detido no Aeroporto Internacional de Joanesburgo em Dezembro de 2018, na sequência de um mandado de captura internacional emitido por procuradores norte-americanos. Uma vez que os investidores americanos se encontravam entre os burlados no escândalo, os EUA exigiam que Chang fosse julgado em Nova Iorque.
Tardiamente, as autoridades moçambicanas disseram que Chang deveria ser julgado em Maputo. Os advogados de Chang tentaram, em vão, durante cinco anos, evitar a sua extradição para os EUA. Por isso, Chang acabou sendo deportado em 2023 da vizinha Africa do Sul para os EUA.
Chang foi considerado culpado de conspiração para cometer fraude electrónica e branqueamento de capitais e, na sexta-feira, o juiz Nicholas Garaufis condenou-o a uma pena de prisão de oito anos e meio.
A acusação pretendia uma pena muito mais longa, entre 11 e 14 anos, mas Garaufis optou por um período mais curto, devido ao estado de saúde precário de Chang, de 69 anos, e ao facto de este já ter passado seis anos detido.
“O arguido, um funcionário público corrupto, colocou o seu próprio país, um país de meios e recursos limitados, com uma dívida superior a dois mil milhões de dólares em empréstimos que acabou por não poder pagar, para que ele e os seus parceiros criminosos pudessem meter no bolso dezenas de milhões de dólares para si próprios”, escreveram os procuradores num processo de 13 de Novembro de 2024.
Se os seis anos atrás das grades forem considerados parte da sentença, Chang terá ainda de passar dois anos e meio numa prisão de Nova Iorque, antes de ser deportado para Moçambique.
As “dívidas ocultas” mergulharam Moçambique numa enorme crise financeira. Quando o Fundo Monetário Internacional (FMI) descobriu a dimensão dos três empréstimos, acusou o governo moçambicano de esconder a verdadeira dimensão da dívida externa do país.
Por isso, o FMI suspendeu o seu programa de assistência técnica e financeira a Moçambique. Como resultado, todos os 14 doadores que prestavam ajuda sob a forma de apoio directo ao Orçamento do Estado suspenderam todos os desembolsos adicionais. O valor da moeda moçambicana, o metical, caiu a pique e só uma intervenção vigorosa do Banco de Moçambique evitou o colapso económico.
A saga ainda não terminou pois, é muito provável que Chang vá recorrer da sentença.
(AIM)
Pf/sg